quarta-feira, 10 de dezembro de 2008

INTELECTUALIDADE LASCIVA

Posição despojada, barba por fazer e cabelos emaranhados. Aquele rapaz sentado à mesa da biblioteca, de óculos e camiseta branca completava uma cena erótica imaginária. Plínio era seu nome. À medida que aquele homem forte e roliço, dono de um arsenal de conhecimento ia seguindo as linhas com seus olhos grudados nas páginas do livro de capa dura e folhas amareladas... ares fantasiosos percorriam a mente de uma mulher estranha que observava o rapaz.

Ela entregando-se aos seus pensamentos libidinosos e sem timidez, senta-se em uma mesa distante quinze metros à que Plínio se encontrava. A mulher desconcentrada, pega um livro de sua mesa sem selecionar, dentre outros que ali estavam, abre-o e finge lê-lo. Fitava sem hesitar o rapaz sisudo que exalava um aroma intelectual, semelhante aos que nos excitam com ar de superioridade.


Plínio sem perceber que era observado, lia atentamente uma velha obra de Érico Veríssimo e convergindo apenas para a leitura, não desviava sua atenção por nada, nem mesmo para o ruído do ventilador de teto. Desligado do mundo, devorava as palavras como um mendigo faminto. Em silêncio, no andamento da leitura, Plínio encravava lentamente os dedos nos seus cabelos lisos e negros, repetindo o movimento por diversas vezes. A mulher, inebriada com o vai e vem da mão máscula e sensual, banhava-se visualmente com a peculiar beleza do rapaz desconhecido. Sua respiração ofegante incomodava seu subconsciente que, naquele momento, aspirava só e somente só, àquele discípulo da intelectualidade.


A sede pelo conhecimento de Plínio desconcertava a sobriedade da desconhecida mulher. Sua face ruborizada denunciava a excitação pelo rapaz. Nervosa, a mulher resolve levantar-se e ir até ele sem titubear, para ao menos falar-lhe algumas palavras. Ao caminhar com passos curtos e firmes, ela fantasiava seu momento de clímax sem racionalidade. 
Seios arrepiados, mãos frias, ombros enrijecidos, a mulher criava coragem para despir seu desejo ao homem de barba rala. Faltando poucos metros para chegar ao seu deus...

Plínio folheia sua obra, inclina-se para o lado. Repara um livro na prateleira, levanta-se indo ao encontro à mulher para pegá-lo. Os dois se cruzam, como que numa perseguição lasciva e sentem seus braços roçando um no outro. Ela continua andando sem olhar para trás. A fricção da pele em fração de segundos faz com que a mulher caia em si. Ela desiste em seguir, insiste em voltar para perguntar algo não sabendo o quê, ao rapaz. Ele a olha parada a sua frente e confuso dirige-se a ela:
− Você é observadora...
− Desculpe, mas por quê? Pergunta a mulher assustada.
− O livro que estava lendo descreve esta cena que estamos passando neste momento. Responde Plínio.
− Que cena, não estou entendendo? Retruca a mulher
− Esta, de nos chocarmos, tocarmos os braços e sentirmos a necessidade de sabermos quem é o outro.
- E o final, em quê dá? Pergunta ela curiosa.
A mulher desconhecida empalidece a face e retoma suas fantasias subconscientes perguntando ao rapaz qual o seu gosto preferido pelos livros. Ele lhe responde, até que, trocando olhares caminham juntos em direção à mesma mesa em que Plínio se encontrava ao ter sua hábil leitura. Curiosa, a mulher simula desentendimento, senta-se ao lado do rapaz e solicita explicações sobre a obra que o mesmo lera.


Embevecidos pela curiosidade, não se sabe ao certo se para entender a obra lida, ou pelo simples fato de desvendar o novo que estar por vir... ambos se devoravam com olhares e mais olhares, palavras e gestos em plena biblioteca, lugar puro, sublime, sem perversidade, sem interesse ou talvez sim, quem sabe...numa cúmplice paixão intelectual e avassaladora.

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