quarta-feira, 10 de dezembro de 2008

PIERRÔ APAIXONADO


Naquele calor terrível estávamos eu e Sérgio na terra do frevo em pleno Carnaval. Neste ano, a festa do Pierrô Apaixonado caía em meu aniversário.
Havia rompido um relacionamento e resolvi comemorar a liberdade com meu parceiro de todas as horas, desde aquela minha época da Faculdade de Arquitetura, até os dias de hoje.
Dois amigos inseparáveis carregando suas malas, caminhando pelas ladeiras de Olinda, chegando eufóricos, porém cansados de uma viagem fatigante de ônibus. Eu, já conhecia a festa, o Sérgio não. Ele, a medida que caminhava ia desvirginando sua vista com aquelas tipologias arquitetônicas e culturais tão peculiares que só Olinda tem.
Subíamos e descíamos ladeiras, com malas e colchonetes nas costas, a procura da nossa casa alugada. Passados alguns minutos, até que enfim a casa foi achada. Numa turma de 20 pessoas desconhecidas, que iriam se instalar na humilde casa, somente eu e Sérgio para trocarmos sinceridades naquele meu momento nostálgico: Término de um relacionamento e o primeiro aniversário longe da família.
Eu, ansiosa, vou logo tomar banho para animar-me o espírito e cair no frevo. Sérgio, como de costume, foi logo providenciar o que comer. Abriu a geladeira, pegou seu suco preferido, o de uva, deliciou-se com um mero biscoito e sentou-se ao chão da varanda, lugar onde tínhamos escolhido para dormirmos naquela 1ª noite que estava por vir. Naquele carnaval, somente eu e ele em nossa amizade e cumplicidade para esperarmos ansiosos o amanhã, o Dia do Meu Aniversário.
Ao amanhecer, em um marasmo solitário do meu dia, olhei para Sérgio dormindo, olhei ao redor... corpos desconhecidos também dormindo... Somente aquele guri magricela e branquelo estirado em seu colchão, único ser conhecido que me entendia muito bem.
Eu chorava em silêncio, ao me dar conta de que não haveria o desafinado parabéns cantado por meus pais, abrindo a porta do meu quarto como pedia a tradição da família. Ah, que momentos maravilhosos. De repente, deparei-me com uma profunda solidão. Sérgio acorda com meu baixinho soluçar. Olha para mim e quieto como de costume apenas me acalma com sua voz branda me perguntando:
- O que foi menina?
- Nada...só porque é o meu primeiro aniversário que passo longe da família, respondi apática.
Sérgio permanece em silêncio e me abraça. Após alguns minutos... o celular toca. São os amigos e familiares ligando para me proporcionar momentos relâmpagos de alegria mesmo que de longe. Levanto-me apressada para pegarmos carona no primeiro bloco de frevo que passa e tentamos diluir aos poucos minha tristeza sem nenhum diálogo.
Nos primeiros passos pelas ruas, os gigantes humanos desengonçados percorriam por entre aquela massa efervescente repleta de crianças, adultos e idosos embalados ao som contagiante do frevo. Confetes e serpentinas coloriam os ares de Olinda e também o meu. Quanto a minha solidão, despedi-me dela ao jogá-la em pleno auge carnavalesco, olhei para Sérgio que me retribuiu o olhar, e seguimos na multidão.

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